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Foto do Podcast falando sobre adultização infantil

Os desafios da adolescência e o fenômeno da adultização infantil

A adolescência é uma fase de descobertas, conflitos e transformações. Porém, nos últimos anos, o que percebemos é que essa etapa da vida ganhou um contorno ainda mais complexo. Com o excesso de informações, os novos estímulos e as transformações sociais , muitos adolescentes têm assumido expectativas e hábitos da vida adulta antes do tempo. É nesse cenário que surge o fenômeno da adultização.

No episódio #31 do videocast Sinto Que Lá Vem História, a juíza da Vara da Infância e Juventude do Rio de Janeiro, Vanessa Cavalieri, e o Mestre em Educação, CEO e fundador do LIV, Caio Lo Bianco, refletem sobre essa tensão entre infância, adolescência e pressões externas. 

O que é adultização infantil?

Adultização é o fenômeno pelo qual crianças e adolescentes assumem responsabilidades, preocupações ou comportamentos que seriam típicos de adultos. Essa situação acontece sem terem desenvolvido plenamente a capacidade emocional e cognitiva necessária para lidar com essas situações. 

No videocast, Vanessa exemplifica que muitas vezes o contexto familiar ou social impulsiona essa maturidade precoce, mas nem sempre isso é positivo. A criança ou adolescente acaba vivendo experiências que deveriam vir mais tarde, e isso pode gerar impactos negativos nos âmbitos emocional, social e até acadêmico.

Essa situação aconteceu com ela. Vanessa relembra: 

Eu era uma adolescente super madura para a minha idade, muito comportada. Acho que tenho uma história familiar que me levou a isso. Meu pai abandonou a família. Meus pais se separaram quando eu tinha 3 anos e ele se tornou completamente ausente. 

Não convivi com meu pai na infância e nem na adolescência. O fato é que, com 14 anos, eu cuidava de mim e da minha mãe. Então amadureci muito, mas também tinha dificuldade de socializar na escola, não me encontrava ali, não sentia que eu pertencia.

Refletindo nessa fala da Vanessa, podemos perceber que, quando falamos em adultização infantil, não estamos somente observando comportamentos isolados, mas um reflexo de tensões sociais, familiares e culturais que empurram os jovens para além do que deveriam experimentar nesta fase da vida.

A adolescência e seus desafios históricos

O conceito moderno de adolescência é recente. E reconhecer que existe uma etapa entre a infância e a vida adulta é um avanço da sociedade, mas também exige novas formas de apoio e compreensão. 

Vanessa destaca um ponto curioso sobre a adolescência ao longo da história: “Há 100 anos nem se reconhecia que existia adolescência… quando a menina se tornava fértil, já era preparada para casar com 14 anos, e com 16, vinham os filhos” .

Hoje, os adolescentes enfrentam um mundo cheio de informações, tecnologias e redes sociais, que moldam sua experiência e, muitas vezes, os incentivam a assumir papéis próprios da fase adulta. 

A influência das telas e redes sociais

Não podemos falar de adolescência hoje sem considerar o papel das tecnologias digitais. Vanessa aponta: “Os adolescentes brasileiros passam em média 7 horas por dia nas redes sociais… isso molda quem eles são e o futuro da sociedade”.

O excesso de exposição a conteúdos não adequados, expectativas e comparações constantes aumenta a pressão para amadurecimento precoce. Nesse cenário desafiador, muitos pais não sabem o que fazer.

Sobre isso, Caio reforça: “As famílias querem respostas prontas… mas é o adulto que precisa descobrir junto, refletir, dialogar” .

Esse processo de mediação é o que ajuda a criança e o adolescente a entender aquilo que é próprio para a fase da vida em que se encontra.  

Crise de autoridade e parentalidade disfuncional 

Outro ponto central discutido no episódio é a crise de autoridade. Vanessa comenta: “A função do pai e da mãe é serem os adultos da família… darem limites, ajudarem a regular, fazerem aquilo que a criança e o adolescente não conseguem fazer sozinhos” .

Quando a autoridade não é exercida de forma clara e equilibrada, ou quando os pais tentam ser somente amigos, os jovens podem se sentir perdidos e sobrecarregados, assumindo responsabilidades de adultos para preencher esse vazio.

Essa situação se reflete na escola, onde a crise de autoridade familiar e a judicialização de conflitos complicam ainda mais o cenário. Vanessa explica: “Quase 100% dos casos que envolvem conflito escolar, enviamos para justiça restaurativa… onde famílias, professores e adolescentes participam de um processo circular para aprender com o conflito” .

Ou seja, o cuidado restaurativo se torna essencial para ensinar habilidades socioemocionais sem punir, mas nem todas as escolas aplicam essa prática.

O papel da educação socioemocional

Para lidar com a adultização infantil, programas que fortalecem a inteligência emocional  são fundamentais. Caio enfatiza a importância de um  programa socioemocional que atue em parceria com as  escolas e com as famílias, permitindo que os adolescentes desenvolvam autoconhecimento, empatia e capacidade de lidar com frustrações.

“Se queremos que os adolescentes sejam mais equilibrados, precisamos de uma educação que não seja apenas sobre regras, mas sobre como entender sentimentos, lidar com conflitos e se conectar” — comenta Caio.

Aqui, o LIV atua oferecendo ferramentas de educação socioemocional que dialogam com a linguagem do aluno, tornando a aprendizagem leve e acessível, evitando fórmulas prontas e estimulando a reflexão, autonomia e o diálogo.

Adultização infantil: quando o jovem é forçado a pular etapas

Cada fase da vida tem uma função essencial: brincar, aprender a lidar com frustrações, desenvolver autonomia de forma gradual e construir vínculos sociais seguros. Quando esse processo natural é interrompido, o jovem perde experiências fundamentais, o que pode impactar suas relações futuras, sua identidade e até sua saúde emocional.

Vanessa explica a importância da presença ativa dos adultos nesse processo: “O que falta é assumir nosso papel, lidar com o adolescente, colocar limites, mas também descobrir junto… o adulto precisa ser real, com falhas, aprendendo junto.”

Ao se colocarem como referência e guia, pais, educadores e cuidadores fortalecem os vínculos com os adolescentes, oferecendo suporte emocional em vez de sobrecarga. Esse equilíbrio ajuda os jovens a viverem cada etapa do desenvolvimento no seu tempo, sem precisar enfrentar o peso de responsabilidades adultas antes da hora.

Como acompanhar e apoiar?

O primeiro passo é compreender o adolescente de forma acolhedora e informada. Vanessa recomenda o “letramento em adolescência”, ou seja, capacitar adultos a entender neurociência, desenvolvimento emocional e dinâmicas sociais dessa fase.

Caio lembra que a curiosidade sobre o mundo adolescente é natural, e que o diálogo aberto e respeitoso é crucial: “Não é sobre tirar o celular, é sobre conversar, descobrir junto, colocar limites com reflexão e apoio”.

Essa postura evita a adultização, ajuda adolescentes a lidar com conflitos e promove experiências que fortalecem sua identidade e resiliência.

Convite à reflexão

Gostou da conversa sobre adultização infantil? Para continuar essa importante reflexão, convidamos você a assistir ao episódio #31 do videocast Sinto Que Lá Vem História, que já está disponível no YouTube e no Spotify.




O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.