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Marcia Tavares - pedagoga

Seis questões para refletir sobre a inclusão escolar

A reflexão sobre a inclusão escolar no Brasil exige multiplicidade de olhares e uma análise atenta dos dados, pois, embora prevista na legislação desde 2015, a educação especial ainda passa por desafios na garantia de um atendimento de qualidade. Para comentar esses desafios, nós entrevistamos a pedagoga e especialista em inclusão Marcia Tavares.

Educadora com formação em Pedagogia na Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Marcia Tavares participou como terapeuta do treinamento TEACCH na Universidade da Carolina do Norte (Estados Unidos), tendo também atuado como professora regente em turma de Educação Infantil e Ensino Fundamental. Atualmente, é mestranda em Ciência da Educação e Educação Especial na Universidade do Porto (Portugal) e fundadora do Núcleo de Desenvolvimento Marcia Tavares. 

A entrevista completa você assiste no vídeo a seguir.

Logo abaixo do vídeo, você pode conferir alguns dados atuais da inclusão escolar no Brasil e uma seleção de trechos dessa entrevista exclusiva. Confira:

Um retrato da educação especial

 Um breve olhar para o cenário da educação especial mostra que, em 2019, o Brasil contava com 1.250.967 matrículas de crianças e adolescentes nesse segmento, segundo dados do último Censo Escolar, divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

 A análise dos dados mostra que o percentual de alunos com deficiência, autismo ou altas habilidades matriculados em classe comuns tem aumentado gradualmente em todas as etapas de ensino. Em comparação com 2018, por exemplo, houve aumento de 5,9%, e de 34,4% em relação a 2015. Do total de alunos com necessidades educacionais especiais, a vasta maioria (1.013.931) faz parte da rede pública de ensino.

 Especialistas indicam que uma educação especial e inclusiva exige, além de adaptação dos conteúdos, uma infraestrutura adequada para atender às necessidades de cada estudante. Contudo, os dados nacionais revelam também que a adaptação do ambiente físico das escolas ainda está longe de responder à demanda. Segundo índices compilados pelo site Qedu em 2018, nas escolas da rede privada que oferecem Ensino Fundamental, por exemplo, 55,6% das escolas possuem banheiros adaptados e 44,7% oferecem dependências adequadas a alunos com deficiências. 

Nas escolas que também possuem o Ensino Médio, os números são ligeiramente maiores: 52,7% apresentam dependências adequadas. Já na rede pública, 28% das escolas com Ensino Fundamental apresentam essas condições e, no Ensino Médio, 44,3%.

 

Seis questões para Marcia Tavares

  1. LIV – O que é inclusão escolar?

Marcia Tavares – De maneira muito cartesiana, é o ato de incluir. E se estamos falando em incluir, são todos os elementos e atores que fazem parte desse contexto: os professores, a família, o aluno e toda a rede que está por trás da escola. […] A gente precisa ter um modelo que não seja estagnado nas possibilidades de circulação. A maior função da inclusão é essa.

  1. LIV – Quais os desafios para avançar nesse cenário?

Marcia – Precisamos pensar no sujeito, o que se espera dele, o que ele tem para contribuir e quais são as transições que podemos fazer. Muitas vezes, a inclusão necessária é uma estratégia de conduta, de apresentação do material, do espaço físico. […] Precisamos caminhar no sentido de desmistificar e sair de um lugar de ignorar algumas possibilidades que já existem.

  1. LIV – Quais cuidados o educador precisa ter para, ao incluir, não rotular um aluno?

Marcia – O professor, e qualquer sujeito, precisa estar sempre no lugar de aprendiz. […] Assim, a gente entra em uma condição na qual eu não preciso saber tudo sobre aquela pessoa, pois eu preciso saber sobre pessoas e estar disposta a evoluir, melhorar, criar melhores condições […]. Quando a gente compreende e inclui, nós, de alguma forma, olhamos o sujeito e fazemos uma troca, o que eu tenho para te dar, o que você pode me dar e como isso contribui para outras estruturas. 

  1. LIV – Como a educação socioemocional pode ajudar nesse sentido?

Marcia – O maior ganho é a abertura na comunicação. Como qualquer questão do desenvolvimento, estamos falando de pessoas, que podem ser ajustadas, lapidadas, modificadas. Mas a principal função que eu percebo foi ter aberto um canal de escuta, de conexão, de ousar abrir os temas antes das situações de “incêndio”. 

  1. LIV – Que formação o educador precisa ter para falar sobre inclusão?

Marcia – A gente precisa ter professores atualizados em relação a ferramentas […] que ajudam na integração do aluno com o aprendizado. Eu penso que esse professor precisa ser um sujeito aprendiz, [que possa dizer] “eu não sei isso”. Eu até tenho um pouco de preocupação quando se sabe demais, porque quem sabe demais não tem o que trocar, a escuta não dá uma interrogação para pesquisar mais, aprofundar ou até discordar e criar uma nova estrutura.

  1. LIV – E no caso daqueles que sentem dificuldade em lidar com o tema? O que fazer?

Marcia – Se coloque, fale, troque suas informações. Essa posição de incômodo e de angústia é o que pode fazer a diferença. Se isso for velado, a gente não contribui nem para os nossos alunos, nem para a possibilidade de aprendizado. […] É da nossa responsabilidade acolher, acatar o que for possível, mas sobretudo orientar. Da mesma forma que falamos que os professores precisam ter acesso ao desenvolvimento, não só aos conteúdos, a mesma coisa é poder trocar com as famílias. […] Não dizendo, “é possível” ou “não é possível”, mas criando essa construção. 



O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.