23/09/2024
Todo mundo quer a felicidade dos filhos, mas é preciso deixá-los se frustrar, diz CEO do LIV
“Eu só quero que meu filho seja feliz”. Quantas vezes você já disse ou escutou essa frase? Muitas, não é mesmo? Mas, em algum momento, parou para refletir se a busca incessante pela felicidade pode trazer algum prejuízo para a saúde mental?
A provocação foi feita por Caio Lo Bianco, fundador e CEO do LIV. Em uma palestra voltada para gestores de escolas de todo o Brasil, ele defendeu que a ideia de felicidade que impera, que busca a maximização do prazer, é simplista, pois não leva em consideração algum nível de sofrimento, inevitável na vida de todos.
“Foi criada uma falsa ideia de que é possível se escolher entre felicidade e sofrimento e que o indivíduo tem a responsabilidade por seu destino. É uma mentalidade individualista, na qual a culpa pela inadequação, pelo fracasso social, é da pessoa, pois, se ela quiser, pode superar as dificuldades. Isso gera muita frustração em quem não consegue”.
Escolas e famílias precisam de nova abordagem
Caio defende que a sociedade, as escolas e famílias tenham uma nova abordagem, mais dialética, que enxergue que a felicidade não é o oposto de sofrimento.
“Precisamos resgatar isso nas escolas, não podemos tratar as crianças ignorando o mal-estar de viver. Nossas crianças crescem numa bolha de proteção. E na adolescência percebem que a vida não é um conto de fadas, que não são as mais legais ou bonitas, as mais inteligentes. Não há um modo de mostrar mais cedo como o mundo é? A gente não discute derrotas e perdas e esquece a importância do não, da frustração”.
O CEO do LIV também diz que os pais precisam mostrar suas fragilidades, suas derrotas para evitar que os filhos acreditem que eles são perfeitos. Essa idealização, argumenta Caio, pode levar crianças e adolescentes a pensar que precisam seguir o mesmo padrão para serem amados.
Medicalização: é preciso tanto diagnóstico?
Caio também defende que, ao esquecermos que a infelicidade também faz parte da vida, passamos a tratá-la, muitas vezes, como transtorno mental, levando a uma medicalização excessiva de adultos, crianças e adolescentes. Hoje em dia, diz Caio, citando a psiquiatra americana Anna Lembke, nos esforçamos para eliminar qualquer tipo de dor ou incômodo. Essa obsessão pela ausência completa de dor, nos leva a extremos, como ao consumo, nos Estados Unidos, de remédios psiquiátricos diários para uma a cada 20 crianças.
Sem ignorar a extrema importância dos medicamentos em muitos casos, Caio defende que existe um custo ao medicar todo tipo de sofrimento humano. E esse custo está cada vez mais alto. Cada vez mais usamos mais remédios para dor e cada vez mais pessoas morrem viciadas em remédios para dor.
Impacto das redes sociais precisa ser levado em conta
Especialista em suicídio de jovens, com mestrado sobre o tema pela Universidade de Columbia, em Nova York, Caio Lo Bianco também fala sobre o impacto do excesso de telas na saúde mental dos adolescentes. As redes sociais, onde a perfeição é exaltada e todo mundo parece estar sempre feliz, diz, descolam os adolescentes daquilo que é real, mas não é só.
“Elas oferecem sempre mais do mesmo por conta do algoritmo. Elas, em tese, seriam ótimas para se conhecer o outro, mas o que elas fazem, na verdade, é isolar, conhecer mais do mesmo. Além disso, oferecem a facilidade de se acabar com um relacionamento com um clique. É um fim sem ritos, sem luto, que não dá espaço nem tempo para lidar com o sofrimento”.
Em meio a estes desafios, ele defende que é preciso oferecer aos adolescentes espaços de escuta e fala, onde eles possam conversar sobre emoções e sentimentos, tanto dentro da família quanto da escola. “É preciso dar voz ao indivíduo que sofre. O suicídio é uma falha no campo da palavra. Precisamos recuperar a possibilidade que esse jovem possa falar do seu mal-estar”, finaliza.
Quer conhecer mais sobre o LIV e o desenvolvimento de habilidades socioemocionais? Confira mais nas redes sociais e fique ligado nos próximos episódios do Sinto que Lá Vem História.
O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.