
10/09/2025
Literatura e educação: caminhos que despertam afetos e memórias
Já se perguntou sobre como a palavra e a escuta podem contribuir para a formação socioemocional de crianças e adolescentes?
Em uma realidade onde o tempo parece cada vez mais acelerado e a capacidade de atenção se molda a conteúdos curtos e imediatos, abrir um livro pode ser parecido com um ato de resistência.
E é justamente com essa atitude que abrimos caminhos importantes para o desenvolvimento da criatividade, pensamento crítico, formação de memórias profundas e uma compreensão mais sensível de si e do outro.
A infância é um tempo em que tudo pode ser vivido pela primeira vez. E é também nesse momento da vida que as histórias ganham mais poder, entretendo e formando. É ao ouvir uma narrativa ou criar uma própria que a criança começa a organizar sentimentos, nomear emoções e experimentar o mundo com outras lentes.
No artigo a seguir, você vai entender como um bom livro pode ser o primeiro convite que a criança recebe para imaginar futuros e se encantar com as possibilidades da vida.
Afinal, qual a importância da literatura na educação?
Literatura e educação são importantes para abrir espaços de afeto, escuta, empatia e, principalmente, de construção de sentido para crianças e jovens. Por meio das histórias, as crianças têm a oportunidade de viver emoções e situações que ajudam a compreender melhor o mundo.
Nosso cérebro, inclusive, reage às histórias quase como se fossem experiências reais, tornando a leitura uma forma poderosa de aprendizado emocional (Roberts & Crawford, 2008).
A literatura, nesse sentido, é uma das formas mais potentes de criar vínculos. Ela ajuda a consolidar memórias, a construir repertórios afetivos e culturais, e a favorecer o desenvolvimento da empatia, uma habilidade essencial para a vida em sociedade.
Como a literatura transforma a vida das crianças?
Ao acompanhar os sentimentos dos personagens, as crianças podem experimentar emoções difíceis de forma simbólica. Elas aprendem a nomear o medo, o ciúme, a raiva ou a saudade, e desenvolvem conhecimento interno para lidar com essas emoções no cotidiano.
Mia Couto, escritor moçambicano que tem encantado gerações com sua escrita poética e cheia de humanidade, afirma que:
“A criança até uma certa idade pede que se repita sempre a mesma história… ela precisa sentir que existe um chão, uma rede estável de relações que lhe confere lugar seguro… só depois ela ganha gosto para criar, improvisar, se surpreender.”
Essa fala revela muito do que está por trás da função afetiva da literatura. Quando uma história é lida em conjunto, quando há tempo para conversar sobre os personagens ou há liberdade para reinventar finais, a criança sente que tem voz, que pode imaginar, lembrar, sentir e ser escutada.
Desafios a serem enfrentados pelo caminho
Em um cenário de consumo rápido de informações e estímulos digitais, o tempo da leitura pode acabar se opondo ao imediatismo digital. Enquanto nas telas tudo pisca, muda e distrai, nos livros somos convidados à permanência, à reflexão, à pausa.
Mas para que isso aconteça, é preciso criar espaço. Um espaço onde a criança possa ouvir uma história sem pressa, criar a sua própria narrativa, sentir e pensar com liberdade.
No LIV, acreditamos que esse processo pode acontecer tanto na escola quanto em casa. Quando educadores e famílias criam espaços para a contação de histórias, escrita criativa e até rodas de leitura em grupo, eles estão colaborando com o letramento e com a formação integral do aluno.
Por isso, o LIV, como programa socioemocional, incentiva práticas em que o afeto, o diálogo e a escuta estejam no centro da experiência educativa.
A leitura de livros que abordam sentimentos e relações humanas, por exemplo, é um caminho potente. Já contamos em nosso outro artigo “8 livros e dicas sobre sentimentos e educação socioemocional”, que há diversas sugestões de obras que ajudam pais e professores a tratarem de temas delicados de maneira lúdica. Se quiser conferir depois, aproveite para acompanhar essa lista selecionada pelo LIV.
A arte e literatura na educação infantil também podem se unir em práticas interdisciplinares para encantar as crianças. Ao desenhar a cena de um livro ou criar fantoches dos personagens, a criança se apropria da narrativa e transforma o conhecimento em vivência. E isso vale tanto para a educação infantil quanto para o ensino fundamental: em todas as idades há potência na criação de histórias.
O papel da escola e da família nesse processo
Talvez o maior presente que a escola e a família possam oferecer a uma criança seja um espaço onde ela se sinta acolhida e convidada a imaginar. A leitura, nesse contexto, pode ser um ponto de encontro entre gerações, um momento de conexão que não exige respostas certas, mas que abre caminhos para perguntas, sentimentos e descobertas.
Vale lembrar que nem toda leitura precisa ter uma “lição”. Histórias engraçadas, absurdas ou puramente fantasiosas podem tocar lugares profundos. Afinal, o riso, a imaginação e o encantamento também fazem parte da vida.
Como diz o escritor moçambicano Mia Couto, “a infância não é uma idade, é uma disponibilidade para o encantamento”. E esse encantamento, muitas vezes, nasce dentro de uma história bem contada.
Com o tempo, esse vínculo vai além do conteúdo do livro. Ele se transforma na memória de quem contou, de quem ouviu junto, de quem acolheu. Muitos adultos guardam o nome de um livro da infância, mas o que mais permanece é a lembrança de quem estava ao lado naquele momento. E essas memórias emocionais seguem reverberando ao longo da vida.
Por isso, incentivar a leitura pode ser um gesto de cuidado e um espaço para dizer: “sua imaginação importa e o que você sente também”.
E se você quiser se aprofundar ainda mais na temática literatura e educação, sugerimos conferir este episódio especial do videocast “Sinto Que Lá Vem História”, com a ilustre participação do escritor e vencedor do Prêmio Camões Mia Couto, uma das maiores vozes da literatura contemporânea.
Na conversa, Mia compartilha sua formação como leitor e escritor, marcada pela experiência familiar. Filho de emigrantes portugueses em Moçambique, cresceu sem a presença de avós ou uma rede ampla de parentes, mas sua mãe supriu essa ausência inventando histórias sobre os antepassados.
Essas narrativas, ainda que muitas vezes inventadas, criaram um ambiente rico em imaginação, onde a fronteira entre realidade e ficção era tênue. Esse contato precoce com a oralidade e a invenção moldou sua relação com a literatura e a maneira como enxerga o poder das histórias.
Conheça nosso livro do nono ano
Quer conhecer de perto as histórias que moldaram a vida e a literatura de Mia Couto? Não perca essa conversa emocionante e cheia de insights sobre literatura, memória e afetos.
Veja também: Qual a importância do letramento digital
Assista agora no YouTube.
Referências usadas:
https://www.globalpartnership.org/blog/social-and-emotional-learning-through-childrens-literature
https://www.inteligenciadevida.com.br/pt/conteudo/liv-entrevista-mia-couto-arte-e-literatura/
https://www.inteligenciadevida.com.br/pt/conteudo/livros-que-falam-sobre-sentimentos-e-emocoes/
O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.