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LIV Entrevista Renato Noguera

LIV entrevista Renato Noguera: uma conversa sobre afeto, educação e amor

Em vídeo, o filósofo Renato Noguera conta suas perspectivas sobre o papel da educação como catalisadora de esperanças e explica por que decidiu escrever sobre o amor. Confira!

Renato Noguera é doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de professor, escritor e pesquisador da filosofia africana. Também é defensor de uma mudança de paradigmas em sua área e defende caminhos para descolonizar as referências utilizadas no pensamento filosófico ocidental, muito baseado em autores de origem europeia.

Em 2021, ele participou de um webinar com o LIV, no qual falou sobre educação e afeto, e trouxe para todos os participantes perspectiva sobre o tema. Após o evento, o filósofo gravou um vídeo exclusivo para o blog do programa LIV, no qual falou sobre o papel da escola e sua visão sobre o amor, tema de seu último livro.

A seguir, você pode assistir a esse conteúdo ou conferir os principais trechos no texto abaixo. Confira!

LIV entrevista Renato Noguera

1. No seu último webinar com o LIV, você falou sobre a incerteza de nossos tempos e como elas afetam nossa saúde mental. Você pode falar um pouco sobre o papel da escola como catalisadora de esperanças nesse cenário? 

Renato Noguera –A escola é um território fundamental, uma instância que existe em toda a sociedade, que tem uma função educativa e uma função de preservação da saúde. O conhecimento é nutritivo. Se a gente pensar com a filosofia Orunmilá, conhecer é um ato de nutrição da nossa alma. E a escola é um território que nos habilita esse processo de aprendizado, esse processo de nutrição intelectual. E a esperança é um alimento. 

A esperança é o alimento fundamental para que a gente possa resolver, enfrentar os desafios do presente e os desafios do futuro. Sem escola, a gente vai ter muito mais dificuldade de enfrentar esses desafios. E a escola é um local onde se prepara esperança”.

2. Você recentemente lançou o livro “Por que amamos: O que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor“. De onde veio a motivação para escrever sobre esse sentimento? 

Renato Noguera – “O livro ‘Por Que Amamos’ foi um presente após conversas com a editora da HarperCollins e que tem relação direta com o curso que eu ministro há alguns anos na Casa do Saber. […] Isso me remetia a uma pesquisa, um estudo que eu fiz quando tinha 23 anos. Eu fazia mestrado, isso em 1996, e em uma matéria que eu fazia na USP de Filosofia e Psicanálise, eu fiz um texto sobre a metafísica do amor sexual, baseado na filosofia de Schopenhauer. Então, repetindo o título do texto de Schopenhauer, eu procurei descrever esses movimentos. Esse percurso começou desse estudo em 96, e anos depois mais tarde, ao trabalhar no curso ‘Quatro lições sobre o amor’, indo de Platão até Sobonfu Somé. Isso deixou alguns rascunhos e manuscritos. Em 2020, publicamos o livro ‘Por que amamos: o que os mitos e a filosofia têm a dizer sobre o amor’”.

3. No seu livro, você cita referências de diferentes culturas e épocas. Como essas diferentes perspectivas se comunicam quando o assunto é o amor?

Renato Noguera – “A importância de citar várias perspectivas e épocas para a gente compreender o amor e para dar uma dimensão que o amor é polissêmico. Não só no seu significado, mas também na sua estrutura e nas suas conjunturas. Ou seja, o amor é o sentimento, portanto ele é um afeto, mas o amor é um ato político. 

O amor também é um cimento do tecido social. O amor se comporta de múltiplas maneiras. Você pode pensar o amor politicamente. Pode-se pensar o amor de modo científico, no campo da neurociência. Pode pensá-lo filosoficamente ou no campo psíquico. No campo da psicologia e psicanálise. 

A gente pode pensar o amor de inúmeras formas. A importância de apresentar épocas e perspectivas é para que a gente possa ter uma dimensão mais ampliada possível desse sentimento, desse afeto, desse ato político que é o amor. É uma coisa que eu tentei enfrentar, essa pergunta ‘Por que amamos?’ e respondo essa pergunta ao final do livro. Eu justifico porque a gente precisa passar por várias épocas, várias perspectivas, para uma compreensão mais acurada do amor”. 

4. Este ano, o tema do amor também apareceu no livro de Bell Hooks “Tudo sobre o amor”. Para você, qual a importância de falar sobre isso nos dias de hoje?

Renato Noguera – “Falar de amor nos dias atuais é tão importante porque a gente está indo contra uma certa ‘clicheria’ que fala do amor, mas sem tocar, sem querer se aprofundar e encarar os riscos do amor. Eu acredito que hoje é importante falar do amor para compreender os seus riscos. Em que sentido: o amor pode nos conectar com aquilo que há de mais radical e profundo em cada um de nós, os nossos fantasmas, os nossos medos.

O amor nos conecta também com medo. Essa é uma coisa importante de se dizer. O amor não pode ser encarado como um sentimento barato. O amor tem um custo de energia tão importante que talvez isso explique por que algumas organizações, algumas pessoas falam de amor e parece que a sua prática está muito descolada desse discurso. O amor, uma experiência amorosa, pode trazer coerência performática, o nosso discurso se encaixa com as nossas práticas. Isso é muito importante.  

Por isso é importante falar de amor, para que a gente possa também adequar o nosso discurso às nossas ações. E nesse sentido, falar de amor hoje, assim como Bell Hooks nos diz, é um ato revolucionário”.

5. Em um de seus posts, você afirma que não existem dicas afetivas no geral, pois nenhuma ideia serve para todos. Ao mesmo tempo, muitas pessoas buscam, especialmente na internet, respostas prontas e conselhos já validados em relação aos sentimentos. Como você analisa essa questão?

Renato Noguera – “Quando uma pessoa não tem experiência na culinária, na gastronomia, e tem que fazer um prato, ela recorre a uma receita. Não é errado recorrer a uma receita. Ao mesmo tempo, nenhuma receita pode prever as conjunturas. Às vezes, vai ter a diferença do peso, 120 gramas de um produto, de um alimento, e outro coloca 100 gramas, pode fazer uma diferença na combinação com a cebola, com o alho, na temperatura do fogo, no mexer da panela. Então, procurar uma receita não é ilegítimo. 

Agora, é importante saber que uma receita só funciona no instante em que ela é imprimida. E nada que é imprimido no momento pode ser replicado e repetido. Tem que haver essa disposição de compreender que a gente precisa conhecer as condições em que uma coisa acontece.

E quando a gente fala de amor, talvez tenha um afeto importante: disponibilidade, estar disponível para enfrentar as colisões, os conflitos, as alegrias, as fantasias, o choque de realidade que o amor provoca. E para compreender uma coisa que é a seguinte: o sujeito amado e o sujeito amante, esses papéis se misturam. O desejo nunca vai encontrar o desejo do outro o tempo todo.

[…] É importante considerar as circunstâncias, os desafios, o que é preciso em cada momento. Eu diria que é importante ter consciência e atenção plenas para que a gente possa enfrentar esse desafio de compreensão do amor e de entender que não há receita pronta. E a receita, a gente faz no momento que a gente encontra as circunstâncias e as necessidades para amar”.

A importância dos sentimentos no programa LIV

No programa LIV, sempre buscamos ampliar nossos conhecimentos, trazendo novas fontes e referências sobre inteligência emocional e desenvolvimento socioemocional que permitam olhar esses temas de modo mais amplo – e a conversa que tivemos com Renato Noguera que você acaba de ler é um exemplo disso. 

E se você gostou desse conteúdo, indicamos também outras entrevistas recentes com convidados externos ao programa, que também nos ajudam a abrir novos horizontes. Confira alguns exemplos:

 

 

O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.

 




O LIV – Laboratório Inteligência de Vida é o programa de educação socioemocional presente em escolas de todo o Brasil, criando espaços de fala e escuta para ampliar a compreensão de si, do outro e do mundo.